Joaquim Rodrigo 1914-1996
Engenheiro agrónomo de formação, iniciou já tarde a sua carreira artística. Depois de uma fase de amador, com uma pintura figurativa marcada por Matisse, tomou contacto com o abstraccionismo em 1952, numa viagem a Paris, onde se interessou pela obra de Vasarely e Mondrian, entre outros.
Em 1954 está presente na exposiçãoda Galeria de Março, organizada por José Augusto-França, o I Salão de Arte Abstracta, e a sua obra destaca-se entre os abstracto – geométricos. Explora então esta vertente da pintura, onde assume uma posição de vanguarda, procurando articular as formas em função da forma matricial do próprio quadro: em 1955 estuda a alternância da cor na mesma estrutura linear; em 1956 estuda os valores luminosos; a partir desta altura e até ao final da década, merecem a sua atenção as linhas rectas que seccionam a área em proporções por números inteiros (influência de Mondrian).
LER +/-A partir de 1960, rompe definitivamente com estes valores ao introduzir uma forte componente figurativa, mantendo contudo a clareza metodológica adquirida no abstraccionismo geométrico. É autor de uma pintura figurativa, apelidada de neo – figurativismo, baseada em representações rigorosas de formas propositadamente muito simples colocadas sobre fundos de cores lisas. Para o artista, tratava-se de fazer uma pintura cientificamente correcta, certa, de modo a ser automaticamente compreendida e apreendida por quem a visse, como explicará mais tarde no seu livro “O Complementarismo em Pintura” (1982).
No neo-figurativismo de Rodrigo, as formas, de linhas simples e poucas cores, aparecem recortadas nos fundos. São composições de figuras humanas, animais, letras, sinais, figuras geométricas eoutras, dispostos em esquemas que explicam histórias e impressões do artista acerca de diversas temáticas relacionadas com a sua vida. Numa primeira fase do seu percurso, eram temas próximos do contexto político e social português dos anos 60, assuntos que não eram objecto de notícia dos jornais controlados pela censura, mas que muita gente falava, em surdina, com cautela e receio: os grandes acontecimentos políticos internos (acções da oposição, como o assalto ao Santa Maria, em 1961, a guerra colonial, as manifestações operárias) ou as notícias do resto do mundo, então na ebulição dos anos sessenta, com a contestação juvenil, as lutas raciais, as vanguardas culturais…
Ao longo da década de 60 os temas escolhidos passaram a ser cada vez mais as recordações de viagens, de filmes e de outros eventos, tornando-se cada vez mais pessoais as suas figuras “certas”. Persegue a teoria da cor e nos seus quadros ela é reduzida a duas cores, o vermelho e o ocre, e a duas não-cores, o branco e o preto. A distribuição do cromatismo e das figuras obedece a regras que ele próprio definiu.
Apesar de aplaudido pela crítica mais qualificada, a pouca informação do público e os preconceitos de alguns críticos e artistas (que não conseguiam entender que praticantes do geometrismo ) Rodrigo- e do informalismo -Paula Rego- pudessem manifestar preocupações psicológicas e sociais), fez com que não se desse a valorização imediata e devida a este artista. Mais tarde, quando as suas obras começam a ser aceites, foram-no sobretudo pelo referente político narrado e não tanto pela inovação na linguagem visual. É então que Joaquim Rodrigo passa a concentrar-se na sistematização dessa linguagem do signo puro, expressiva agora da sua vida pessoal, como garantia de que a sua mensagem iria persistir.
Assim, nas obras da década seguinte o quadro é transformado numa sintética cartografiados signos de um itinerário pessoal. Em 1976 escreve “O Complementarismo em Pintura”, que será publicado em 1982, e onde pretende sistematizar e teorizar a arte da pintura portuguesa no séc. XX.
As obras dos anos 80 introduzem de forma mais declarada a memória associada a uma profusão de paisagens.
Esta arte de signos que Joaquim Rodrigo desenvolveu de forma tão original, remete para o grafitismo, uma forma de expressão iniciada nos EUA e mais próxima de uma apreensão por parte da gente comum, logo, usada como contraponto às imagens mecânicas dos meios de comunicação de massas. Está, deste modo, relacionada coma s marcas anti-sociais que povoam a paisagem urbana. Mas a arte de Rodrigo tem também alguma inspiração na arte dita Primitiva, nomeadamente nas pinturas da Lunda (Angola) e na arte dos aborígenes da Austrália, onde se verifica a mesma redução cromática. E para além destas referências, a arte de Rodrigo relaciona-se com a imaginação, a memória, elementos retirados do inconsciente, de uma existência original ou arquétipa.
À laia de conclusão, podemos dizer que Joaquim Rodrigo foi o inventor daquilo que ele mesmo chamou “pintura certa”, uma arte figurativa, única pela originalidade temática e pela coerência de princípios formais.